segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

O Homem-Placa e as Coxas da Mamãe-Noel



Era véspera de natal. Ele tinha longa barba branca e seu saco estava cheio. Não. Não era Papai Noel. Não mais. Este ano ele era o "Homem-Placa". E em sua placa, que lhe cobria o corpo inteiro, havia a indicação de uma loja que vendia produtos da Avon. Na galeria, quase esquina da Av. Paulista com a Brigadeiro Luis Antônio.
--- Mas como não vou ser Papai Noel, este ano?
--- Papai Noel é pras crianças! Funciona no shopping! A circulação na galeria é de adultos! Este ano, decidimos ter uma gostosona de 'mamãe-noel', pra chamar a atenção dos marmanjos! Sheila! Chega mais! Esse é o Seu Arthur! O ex-Papai Noel! Esse ano é o "Homem-Placa" e você, com sua...Bem... Simpatia...Vai distribuir os folhetos, ok?
--- Oi, Seu Arthur!
O Homem-Placa não conseguiu ser rude com aquela "cavala" de minúsculo vestido vermelho e com coxas fartas.
--- Oi...Seja bem vinda...
O dia passa, e Seu Arthur sente na própria pele, um "milagre de natal". Tem uma meia ereção por de trás da placa, observando Sheila, que deixou cair os folhetos no chão, acabando por mostrar "meia banda de bunda", revelando a calcinha também vermelha, como manda o figurino natalino.
O ex Papai-Noel , já não acha tão ruim ter o corpo coberto pela placa, e como se estivesse inocentemente "coçando o saco" de brinquedo, se põe à fazer um certo ato, nada condizente com o clima familiar e fraternal que paira sobre a Av. Paulista à essa época.
E, ao contrário do que o chefe havia dito, de repente um menininho gordinho, com cara de coreano surge gritando algo incompreensível e dando tapas na placa do 'bom velhinho', que ao provocar o atrito contra a mão por trás da placa, fazendo "aquilo", faz com que Seu Arthur solte um gemido estranho. Ainda assim, tentando disfarçá-lo com o velho riso do Papai Noel, à tantos anos já praticado:
---- Hoooooo....Hooooooo...Hoooooo...
E lá foi ele, cambaleante, em direção ao banheiro, decidido a limpar a sujeira.
Passando por uma moça e sua mãe, que procuravam um lugar para comer:
---- Temaki....Vamos mãe...Comida japonesa não é de Deus!
Seu Arthur, ao ouvir uma bobagem dessas, fica pensando no que sua vida o levou até aquele momento. Se perguntando sobre o sentido daquele serviço e daquele dia, mesmo na época em que bancava o Papai Noel. Se algo em sua vida já foi "algo de Deus". E que o natal nunca tivera um real sentido, e que aquele emprego nunca fora mais do que um quebra galho para comprar a cerveja e o frango assado da ceia.
No banheiro, lê uma mensagem na porta de um dos reservados, que surpreendentemente não se trata de pornografia: "A conexão humana anda sem sinal". Ao sair também repara que atrás da porta principal do banheiro, foi deixado um colchão. "Por que diabos deixaram um colchão aí atrás? E o meu em casa, aquela desgraça que me ferra com a coluna!"
Já de volta, e no intervalo para um cigarrinho na porta da galeria, um camelô que observa a "mamãe-noel", comenta com Seu Arthur:
---- Sabe o que tenho vontade de fazer com essa menina? O mesmo que vou fazer com o Peru, hoje! Comer em cima da mesa!! HUhaUAHUAHAUAHAUAUAHAUAHAUAHAUAH!!!!!
O Homem-Placa ficou indignado, mas decidiu engolir a raiva. Não havia sentido em bancar o enciumado. Seria ridículo e sem propósito, pois se sentia como um objeto já ultrapassado, que já não encontrava seu lugar nem naquele contexto natalino mais, como se fôra aquele colchão escondido atrás da porta do banheiro, no qual ninguém deita e só serve para se achar certa graça. Uma graça amarga e cruel.


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