domingo, 2 de maio de 2021

Confissões Cabulosas Sobre as Ombreiras de Paulo Ricardo

 

Rey Reyes, ex integrante do Menudo, morreu.

Se você foi um jovem imberbe na década de 80. sabe de quem estou falando. E o que tem isso a ver com o apelativo título desta crônica? Nada muito comprometedor, meu caro. Este título é o que é chamado no mundo da internet de hoje, de "click bait". Não é nada muito vergonhoso, mas é algo que escondi por anos (se comentei com algum camarada, foi sob efeito alcóolico e não lembro) e agora, já que me encontro na meia idade, em meio à essa "peste medieval" do século XXI, resolvi me abrir.

Na minha visão de molecão, um ser à procura de si mesmo, recém saído das fraldas, mas ainda longe de ser um adulto, aquela época em que não sabemos qual é a nossa com esse mundo doido, ainda muito distante de me encontrar como poeta, em minhas tardes góticas de cemitério, com o querido Alvares de Azevedo debaixo do braço, deparava-me com o sucesso do grupo RPM, muito ancorado no "sex appeal" de seu vocalista, a arrancar gritos de entusiasmo das moçoilas a ovularem seus primeiros efluvios femininos. Para mim, aquilo era a realização do papel do homem. E o que se destacava, fora os compridos "mullets" do cantor, eram aquelas enormes ombreiras, símbolos máximos da virilidade, alvos de "elogios homoeróticos" por parte de Caetano Veloso, como relembraria recentemente um enfurecido Lobão: "Porra..Em vez do cara falar da musica, vai falar dos ombros do cara"? De mesmo modo arrebatador, existiam os Menudos, que igualmente faziam as meninas desmaiarem, e com modelitos muito mais simples, faixas e panos que eu poderia amarrar na cabeça e nos braços. Bom, se não poderia arrumar as ombreiras de Paulo Ricardo, então vamos de Menudo, não é? Lembro de chegar na banca de jornal, olhar para os lados pra ver se não vinha nenhum conhecido, apontar muito seriamente para o poster do Menudo á venda, e pedir ao jornaleiro, muito a contragosto: Moço! Minha irmã pediu pra comprar esse poster". O jornaleiro me entregou e piscou pra mim: "Sua irmã, né?" Fui embora, queimando de vergonha, xingando a ignorância do vendedor: "Velho idiota! Não sabe de nada"! 

Chegando em casa, abri o poster, peguei faixas rasgadas de panos de limpeza de minha mãe, e fui me requebrar com muito estilo em frente ao espelho, cantarolando: "Não se reprima! Não se reprima!" No dia seguinte, saí às ruas, me sentindo na "vibe" de pop star, chegando perto das meninas e esperando que elas pulassem em meus braços, ao sentirem aquela excitante energia masculina que emanava de meu ser, mas, nada aconteceu.

Escrevo isso, ouvindo o CD do RPM, cuja musica sim, é boa, já a do Menudo é um lixo, e aprecio apenas a versão de Renato Russo para "Hoje a noite não tem luar", em contraste com a visão de minha estante cheia de livros, e sinto uma ponta de mágoa no peito, dos tempos em que as coisas pareciam tão mais simples, e hoje tenho a cruel certeza de que o buraco é muito mais embaixo. Como disse o poeta inglês Thomas Gray: "Onde a ignorância é uma benção, é loucura ser sábio"... Poisé, e a ironia é ter por fim me encontrado como poeta, deixando a ilusão das ombreiras de Paulo Ricardo para trás, e sentir o peso desse mundo desumano nos ombros, a cada palavra rabiscada no papel.

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