
Antônio estava na quarta cerveja. E a realidade acontecia de modo menos acelerado à sua volta. Antônio era uma parede e a realidade era uma lesma que tentava à custo, alcançar o seu topo. Mas lesmas, o máximo que conseguem é deixar vestígios viscosos. Mas, como parede, Antônio não podia se mover. Sabia que aquela meleca o estava sujando. mas fazer o quê?
O barulho ao redor era menos atordoante que seu barulho interior. O álcool fazia o exterior desacelerar, mas o seu barulho interior apenas se embolava. Um velho disco. Tocando as mesmas velhas canções. Só que na rotação errada. Errada? Antônio não sabia. Apenas queria ouvir aquelas canções de modo diferente. Como uma banda punk tocando Pink Floyd. Sairia outra coisa. Não sairia?
Na mesa à frente, senta-se uma mulher que consegue capturar sua atenção. Como se fosse um anzol jogado naquela água suja em que se encontrava. Jogado pelas mãos do destino ou de Deus, o grande pescador do universo. Afim de uma carne exótica. Carne de poeta. Seria a carne do poeta, doce, como muita gente pensava? Bom...A carne de Antônio, não. Oque havia de adocicado em suas veias, já tinha se tornado veneno à muito tempo. Deus teria uma bela indigestão, com certeza.
Antônio pega tremulamente o guardanapo e tenta escrever suas impressões sobre a mulher. Se ela era a isca, para o peixe poeta, certamente não era o anzol. Com sua magreza esquelética, se assemelhava mais à minhoca. Seus dentes salientes repousavam sobre o lábio, o que fez com que o veneno nas veias do poeta fervessem como óleo quente. O poeta peixe seria frito de tesão doentio, poupando Deus de buscar uma frigideira?
Sim. Tesão doentio. Pois os gostos do poeta eram bem pitorescos. Enlouquecia ao deparar-se com uma mulher dentuça. Quem sabe, tinha a ver com uma paixão de infância? Não se lembrava. O que importava é que teve uma ereção violenta. E o pênis bateu continência, com seu capacete roxo reluzente, de encontro a parte de baixo da mesa. Eis outra peculiaridade do poeta peixe. Gostava de tirar o membro para fora, ocultando-o debaixo da mesa, enquanto se embebedava. Mas não passava disso. Não estava disposto à causar vexame, nem em se 'queimar' no circuito de bares. Era apenas uma mania, bizarra, é verdade. Mas totalmente sadia.
Ela faz seu pedido e tira um livro de Clarice Lispector de dentro da bolsa. Eis a deixa para o poeta peixe, que guarda com dificuldade o pênis ereto para dentro da calça. O fato dele ser torto facilita o procedimento. Torto feito um anzol. Taí. O poeta peixe também iria pescar. Tentaria pescar um peixe dourado chamado felicidade, enterrando seu anzol naquela minhoca. Com sua timidez, normalmente seus passos vacilariam, mas fluiram como uma prancha de surf na água da cerveja ingerida, rumo à um destino desconhecido. Ou poderia pegar sua melhor onda ou quebrar a cara na rocha da decepção, mais uma vez. Aventurou-se.
-- Boa noite! Está sozinha?
-- Porque? Quer pegar as cadeiras?
-- Não! Não...Observei o livro que está lendo. Já leu 'Laços de Família'? Eu tenho lá em casa.
Ela sorri um medonho sorriso equino. Mas, para ele, era o sorriso mais lindo que já viu. E acaba esquecendo de ocultar a ereção, com o casaco a mão. O sorriso equino da mulher minhoca se abre ainda mais. Não era preciso dizer mais nada. A bebida dela chegou. Ela tomou e rumaram os dois para ir ver o tal livro de Clarice.
Lá chegando, ela folheia o velho livro cheio de durex.
-- Pra mim? Obrigada!
-- De nada. Você tem um sorriso lindo, sabia?
Ele diz. Deslizando o dedo na face que era só pele e osso. Ela fecha a cara.
-- Você tá de gozação! Fazem pouco de mim, desde os tempos de escola!
-- Não! Eu não sou como os outros! Eu também sofri preconceito! Eu era o poetinha! O cara bonzinho que era perseguido pelos valentões! Eu desenvolvi um amor por mulheres como você! Você tem uma beleza diferente! Eu te entendo e te amo por isso!
-- Você me ama?
-- Sim! Eu vou te mostrar como seu sorriso me enche de desejo! Fica quietinha! Deixa eu enfiar minha língua debaixo de seu lábio.
-- Hmmmmmmmmmmmmmm....
E assim, o poeta peixe se pôs a deslizar a língua nos dentes e gengiva da mulher minhoca, recolhendo suculentos nacos de restos de alimento, fazendo-a contorcer-se em êxtase.
-- Oh! Meu querido! Devo te confessar que também tenho um desejo sujo à realizar!
O termo 'sujo' fez com que o pênis de Antônio 'acelerasse' como um carrão envenenado de 'Velozes e Furiosos', pronto a triturar o asfalto quente da estrada vaginal da mulher minhoca.
-- Tenho fetiche por cueca suja!
-- Opa! Demorou!
Antônio a agarra pela nuca e a leva para o cesto de roupas suja. Abre, e a nauseabunda fragrância sobe até as narinas da mulher, fazendo-a abrir seu grotesco sorriso.
--Vai querer a coisa com carinho ou na grosseria?
--Ai, querido! Quero cheirar suas cuecas sujas, enquanto me fode por trás, bate na minha bunda e me chama de vadia!
-- Peraí! Vou pegar 'fedôzinho' fresco pra você!
Ele tira as roupas dela, depois as próprias e leva a cueca recém usada até a cabeça dela. Cobre-lhe o rosto com o tecido imundo, que apresenta uma bela 'freada', puxa a cueca como se fosse rédeas e se põe a cavalgar a mulher minhoca. Agora, mais equina do que nunca.
--Hmmmmmfff...Snifff...Hmmmmmmmm....
Tap! Tap! Tap! Tap! Tap! Tap!
-- Vadiaaaaa!!! Vadiaaa!!!
Horas depois, um sol radiante lança seus raios como um afago sobre os corpos adormecidos no chão. Ao lado, o cesto de roupa suja caído.
Na boca da mulher, a cueca emporcalhada. O verdadeiro anzol do amor, nessa história.
Pois a felicidade consiste na satisfação de se ir à uma pescaria e se contentar ao tirar das águas turvas desta vida, não um belo peixe dourado, mas às vezes, um miserável pé de sapato velho.
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